Distante 25 km da sede do município de Castelo do Piauí, a região do povoado Buriti do Sobrado apresenta belezas naturais inexploradas, uma rica vegetação, formações rochosas de variadas formas e tamanhos, cachoeiras, o final do cânion do rio Poti (Pedalta), currais e um sobrado de pedra edificado com mão de obra escrava à época do Brasil Colônia e que serviu como núcleo de povoamento na expansão das fazendas de gado na província do Piauí, além dos muitos mitos, lendas, “causos” e histórias ainda desconhecidos.
O lugar possui esse nome por causa das muitas palmeiras de Buriti e de uma edificação antiga que remonta à época colonial e que servia de sede da fazenda no período de expansão da pecuária extensiva no Nordeste brasileiro. Seria o lugar uma filial da Casa da Torre?
Com uma arquitetura colonial marcante, o Sobrado Velho se destaca imponente em meio a uma vegetação fechada, com arcadas, torres imponentes, salas grandes e muitos quartos, paredes robustas erguidas com enormes blocos de rocha. O piso era em ladrilho com o mesmo estilo das construções portuguesas antigas e o telhado feito com telhas grandes.
Segundo Estevão Alves Mineiro, que é descendente de umas das famílias mais antigas do lugar, um dos donos do Sobrado Velho foi o coronel Irineu Gomes Côrrea, senhor de posse que tinha muito gado na região circunvizinha e era conhecido como coronel Zizuíno.
Existem ainda histórias e lendas que circundam o imaginário popular local, como a de que no sobrado havia rei e muitos súditos, um dos que a história oral não apagou foi o Rei Jhelis. Segundo o historiador Paulo Clímaco, nas tribos africanas era comum, líderes serem chamados de reis, e como o local tinha muitos escravos, possivelmente tinha um rei descendente de sua pátria mãe.
Acrescentou ainda o historiador que pelas características arquitetônicas o sobrado se assemelha muito com a casa da pólvora da então capital da província do Piauí, e que possivelmente Zizuíno seria de Oeiras, como apontam os relatos dos moradores mais antigos da região.
CORONEL ZIZUÍNO “O PERVERSO”
No Sobrado Velho, residência do coronel Zizuíno, uma negra de nome Virgínia trabalhava como mucama para a família. Quando o coronel a viu pela primeira vez encantou-se logo pela beleza da negra. A partir de então começou o calvário da pobre moça com as perseguições de temido coronel, que queria possuí-la de qualquer jeito.
Um dia quando estava sozinha em casa arrumando as coisas e sem a presença da sinhá, Virgínia foi surpreendida com uma tentativa do coronel em agarrá-la tentando beijá-la. Astuta, a negra conseguiu escapar. Enfurecido Zizuíno correu atrás da mucama indefesa que, não tendo outra opção, se jogou do alto da janela do sobrado, caindo e machucando a coluna sem ter condições de se levantar, ficando paralítica para o resto de sua vida. Mesmo sem ter condições de andar novamente a mucama teve um sentimento de alívio por não ter sido possuída pelo coronel perverso.
LENDA DA SANTA DAS PEDRAS
Possível imagem sacra encontrada pela escrava
Um dia uma escrava que vigiava a criação de bodes para que não fossem atacados por onças, encontrou no meio da vegetação e pedregulhos na região entre o atual Buriti do sobrado e Juazeiro do Piauí, uma imagem de uma santa muito parecida com imagens de santo da época do barroco.
A negra a pegou e a beijou colocando em seguida no mesmo lugar, fazendo orações e pedidos de proteção. A negra, segundo se ouviu falar, era uma escrava que veio da antiga fazenda Pimenta, hoje Juazeiro do Piauí.
Temendo contar essa história e ser mal interpretada, passando por mentirosa, a jovem decidiu ficar em silêncio. No dia seguinte ela convidou uma amiga para ir até o local e a santa continuava lá. Passados alguns dias a mulher que foi ver a santa com a escrava contou para o rei que morava no Sobrado Velho e juntamente com sua comitiva, o monarca foi averiguar essa informação. Quando todos chegaram ao local, a madona continuava postada lá. Foi aí que então resolveram retirá-la, mas para a surpresa de todos a imagem não saía.
Foram atrás da moça que a viu pela primeira vez e o rei ordenou que ela a pegasse. Obediente, a negra atendeu e pegou a imagem que saiu com estrema facilidade. Trouxeram-na e em seguida ergueram uma pequena capela para a imagem de pedra que passou a ser a santa de devoção da região do Sobrado Velho.
Segundo Raimundo Soares de Sousa, morador da localidade Cachoeirinha, a imagem da santa de pedra permaneceu com a dona Joana, irmã do Gabriel das Lajes. Hoje essa imagem está postada na capela das Lajes e recebe o nome de Nossa Senhora da Piedade.
CURRAIS DE PEDRAS
Encravado próximo a um penhasco e antigas ruínas que os populares chamam também de sobrado na localidade Santo Antônio dos Gomes, antigo Santo Antônio Velho, estão os currais de pedra. Fortificações feitas com grandes blocos de rocha, utilizando a mão de obra escrava, os coronéis mandavam construir para o alojamento do gado.
Essa prática de currais de pedra era comum nas antigas fazendas de gado do Piauí, iniciadas pelo sertanista Domingos Afonso Mafrense “O Sertão”, sendo o maior fazendeiro da província até então, e pelos Dias D’Ávila, da Casa da Torre da Bahia.
A semelhança com esses currais no Santo Antônio dos Gomes é muito grande e ainda hoje vemos paredes em ruínas com mais de um metro de largura dispostas de forma retangular com mais de 20 metros de comprimento com 15 metros de largura. O que chama atenção é que no local tem currais de tamanhos menores ligados ao maior, caracterizando a divisão do rebanho.
Ainda segundo Paulo Clímaco, a distância de uma fazenda para outra seria de uma légua (6 km) para que o rebanho tanto de um fazendeiro como do outro circulasse livremente pela área de pasto, regra comum seguindo as orientações da carta régia da época. Não era permitido fazer edificação próximo da área, o que podemos perceber ao visitar a região entre as ruínas dos dois sobrados.
Texto: Augusto Júnior Vasconcelos.
Colaboração: Paulo Clímaco Alves.
Matéria publicada na coluna CDP Cultura no Portal CDP
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