Situado em meio a uma vegetação fechada e de difícil acesso, cercado por formações sedimentares que datam da Era Paleozóica, encontramos o Salão dos Índios. O Sítio arqueológico é um dos muitos da comunidade Picos dos André que fica na zona rural de Castelo do Piauí, distante 25 km da sede do município.



O lugar foi por longos períodos de tempo muito povoado, servindo de abrigo e/ou moradia para populações indígenas e primitivas, que deixaram suas marcas com vários indícios de sua passagem pelo local. Mesmo em uma rápida observação, temos a certeza de que eram grupos numerosos e com técnicas de diferentes estilos.


A Vênus de Willendorf

A Vênus de Willendorf é uma estatueta cuja estimativa de existência é de 25 000 anos antes de Cristo. Possui pouco mais de 10 centímetros de altura, representando uma mulher.

Descoberta no sítio arqueológico paleolítico próximo a Willendorf na Áustria, foi esculpida com um tipo diferente de calcário não existente na região. A Vênus era uma idealização da figura feminina com a barriga e os seios volumosos, sendo uma referência a fertilidade.

Por causa dos padrões de beleza da atualidade houve muitas discordâncias quanto à estatueta ser considerada uma Vênus, por casa disso passou a se chamar a Mulher de Willendorf.

Seria uma Vênus, aquela escultura encontrada por mim no Salão dos Índios?

Certo dia, na companhia do mateiro e guia local Carlos Henrique e do historiador Paulo Clímaco, encontrei algo que poderia ser um achado arqueológico, digo poderia, porque depois de alguns meses ela foi perdida (aguarde o desfecho da história).

Para conseguir chegar ao Salão dos Índios, contamos com a valorosa ajuda do mateiro e experiente guia local Carlos Henrique, filho do Sr Mundoca, um dos mais antigos moradores de Picos dos André. Carlos certamente é descendente dos bravos guerreiros que habitaram a região. Muito habilidoso com o facão, ferramenta indispensável a um mateiro, vai abrindo caminhos sem agredir a vida nativa do espaço desbravado por nós.


Andamos bem, talvez uns 8 quilômetros entre ida e volta na vegetação fechada e espinhenta desse nosso pedaço de chão, que testava o tempo todo nossas habilidades de contorcimento, mas, simultaneamente, se deixava abrir em trilhas como se reconhecesse o sertanejo do semiárido que somos. O passo firme, na escalada de rochas sedimentares foi outro desafio que enfrentamos na caminhada, pois as pedras de areia se desmanchavam ao sentir o nosso peso e tornavam a subida ainda mais complicada.

Uuuufa!! Chegamos ao destino e todo o esforço, suor e cansaço valeram a pena. Fomos recompensados com a beleza singular da visão panorâmica do lugar e por conhecer uma das maiores concentrações de arte rupestre do Brasil, composta por figuras antropomorfas, zoomorfas e fitomorfas, além da marcante policromia.


Voltemos ao achado.

Enquanto eu admirava a paisagem e pensava o quanto aquele lugar foi habitado, eis que uma coisa me chamou a atenção. Um pequeno pedaço de rocha de mais ou menos 10 centímetros estava sobre o solo rochoso embaixo de uma figura que lembra um mapa na margem esquerda da trilha. Aproximei-me, peguei-a e fiquei contemplando o achado por alguns segundos, que pareceram séculos e me transportaram para uma viagem no tempo. De volta ao momento eu me perguntava, será?

Ainda sem dizer nada aos companheiros e quase sem acreditar no que tinha nas minhas mãos, respirei fundo e gritei: venham aqui, vejam o que encontrei!

Paulo, num frenesi entusiasta, foi logo gritando: é uma Vênus! É uma Vênus! Carlos acostumado na região disse nunca ter visto algo tão perfeito esculpido da própria rocha (arenito).

A euforia tomou conta da gente e o cansaço que nos consumia naquele instante foi embora quando o sol adormeceu. E ficamos, lá, horas a fio conversando e admirando aquela bela arte.

Antes da chegada dos invasores às terras que hoje fazem parte do Piauí, Índígenas já povoavam os mais distantes rincões de terras do nosso atual estado, desde o litoral até interior, antes mesmo da vinda do colonizador português ao Brasil. Os registros nos sítios arqueológicos que remontam ao Paleolítico e Neolítico nos confirmam esta história.

Como legítimo morador da região e descendente dos bravos guerreiros que ali viveram, deixamos a nossa Vênus na casa do Carlos junto com sua coleção de pequenas pedras. Depois de um tempo, ela sumiu. Isso mesmo, desapareceu.

A coleção de pedras do Carlos continua lá do mesmo jeito, mas o achado mais significativo de todos, não mais.